quinta-feira, 18 de outubro de 2018

O PÓ DE DOMINGO


Como o pó há dias espalha-se incólume por onde quer que olhe, muni-me de panos e paciência para livrar-me dele e do incômodo que tal me dá.
Limpa aqui, limpa acolá...
Quase espirro mas persevero.
Nessa sofreguidão sem sentido abro gavetas esquecidas, aquelas que quase nunca se abre, por não haver nada útil dentro na rotina dos usos.
Logo assim encontro o Tarô de Marseille que mal lembrava possuir, e ler, durante uma fase pseudoesotérica em que mergulhei, por motivos tantos que não cabe aqui contar.
Minha cabeça analítica, até mesmo fálica ao observar as coisas todas, endoideceu ao cheirar incensos, ao viajar nas luzes dos cristais.
Como loucura muitas vezes é como dor de dente, dá e passa, assim também comigo se deu.
Porém o Tarô, cada arcano uma obra de arte a se admitar e pensar, guardei.
Guardei num saco preto como foi-me ensinado a fazer.
No escuro ele permanece por anos, e cabe a mim decidir agora trazê-lo à luz ou não.
Como ele conversa comigo e bem entendo o recado que sussurra aos meus ouvidos, talvez me poupe de abri-lo.
Não temo a Morte, mas o Enforcado.
Não temo a Lua, mas a Papisa.
Sem muito oscilar, entre o pó e meu destino, escolho o pó
Que é mais fácil de limpar.


Tela de Elin Danielson Gambogi - 1861/1919 - Finlândia.
Terê Oliva

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