sexta-feira, 16 de novembro de 2012

OS BIGODES DO GATO.

Tela de Pierre Carrier Belleuse  - (1851/1932)
Pintor Francês.


Acordei com a preguiça dos obtusos, e a danada grudada em mim não abria suas garras, apesar de pouco atrasar os compromissos que eu não tinha.
Nem sol, nem cuco, nem bocejos enfileirados espantou a coreografia dos membros que se recusavam a agir além do retângulo da cama
E abraçavam o travesseiro como se fosse ele o primeiro amor.
O calor chegou do leste com promessas de um dia quente, mas eu me espreguiçava com uma lascívia incomum aos que acreditam que o sono é irmão da morte. 
Dormir é gastar vida, e eu que tenho cobiça pelo tempo que ante meus olhos se esfarela, há muito abandonei esse hábito que o desperdiça.
Nesse chove não molha sinto em meus pés um estranho toque. 
O cérebro, mais rápido que a luz, ergue-me a tempo de ver o gato preto com as duas patas dianteiras apoiadas na minha cama. 
Seus imensos olhos verdes parecem trazer-me um recado do Oráculo que, pobre de mim, não desvendo.
Seus bigodes brilham e se movem para cima e para baixo, como a cheirar meu susto.
Meu salto da cama só não foi mais rápido que o dele ao atravessar a janela
do quarto.

Tela de Jean Gabriel Domergue - (1889/1962)
Pintor Francês.

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