Difícil explicar o silêncio. A própria idéia o define e não permite barulhos outros, porém encontrei este texto, página primeira de livro novo, em que o silêncio chega a ser quase palpável. Divido com vocês...
"Noite outra vez. A Pousada Marco do Percurso estava em silêncio, e era um silêncio em três partes. A parte mais óbvia era uma quietude oca e repleta de ecos, feita das coisas que faltavam. Se houvesse vento, ele sussuraria por entre as árvores, faria a pousada ranger em suas juntas e sopraria o silêncio estrada afora, como folhas de outono arrastadas. Se houvesse uma multidão, ou pelo menos um punhado de homens na pousada, eles encheriam o silêncio de conversa e riso, do burburinho e do clamor esperados de uma casa em que se bebe nas horas sombrias da noite. Se houvesse música...Mas não, é claro que não havia música.
Na verdade, não havia nenhuma dessas coisas e por isso o silêncio persistia. Dentro da pousada, uma dupla de homens se encolhia no canto do bar. Os dois bebiam com serena determinação, evitando discussões sérias ou notícias inquietantes. Com isso, acrescentavam um silêncio pequeno e soturno ao maior e mais oco. Ele formava uma espécie de amálgama, um contraponto.
O terceiro silêncio não era fácil de notar. Se você passasse uma hora escutando, talvez começasse a senti-lo no assoalho de madeira sob os pés e nos barris toscos e lascados atrás do bar. Ele estava no peso da lareira de pedras negras que, conservava o calor de um fogo há muito extinto. Estava no lento vaivém de uma toalha de linho branco esfregada nos veios da madeira do bar. E estava nas mãos do homem ali postado, que polia um pedaço de mogno já reluzente à luz do lampião.
O homem tinha cabelos ruivos de verdade, vermelhos como a chama. Seus olhos eram escuros e distantes, e ele se movia com a segurança sutil de quem conhece muitas coisas. Dele era a Pousada Marco do Percurso, como dele era também o terceiro silêncio. Era apropriado que assim fosse, pois esse era o maior silêncio dos três, englobando os outros dentro de si. Era profundo e amplo como o fim do outono. Pesado como um pedregulho alisado pelo rio. Era o som paciente - som de flor colhida - do homem que espera a morte."
"O Nome do Vento" - Patrick Rothfuss - Página 1Na verdade, não havia nenhuma dessas coisas e por isso o silêncio persistia. Dentro da pousada, uma dupla de homens se encolhia no canto do bar. Os dois bebiam com serena determinação, evitando discussões sérias ou notícias inquietantes. Com isso, acrescentavam um silêncio pequeno e soturno ao maior e mais oco. Ele formava uma espécie de amálgama, um contraponto.
O terceiro silêncio não era fácil de notar. Se você passasse uma hora escutando, talvez começasse a senti-lo no assoalho de madeira sob os pés e nos barris toscos e lascados atrás do bar. Ele estava no peso da lareira de pedras negras que, conservava o calor de um fogo há muito extinto. Estava no lento vaivém de uma toalha de linho branco esfregada nos veios da madeira do bar. E estava nas mãos do homem ali postado, que polia um pedaço de mogno já reluzente à luz do lampião.
O homem tinha cabelos ruivos de verdade, vermelhos como a chama. Seus olhos eram escuros e distantes, e ele se movia com a segurança sutil de quem conhece muitas coisas. Dele era a Pousada Marco do Percurso, como dele era também o terceiro silêncio. Era apropriado que assim fosse, pois esse era o maior silêncio dos três, englobando os outros dentro de si. Era profundo e amplo como o fim do outono. Pesado como um pedregulho alisado pelo rio. Era o som paciente - som de flor colhida - do homem que espera a morte."
3 comentários:
Tenho problemas com silêncios...
Silêncio é presença do vazio. No começo dá um certo medo, mas depois que acostumamos, o que da medo é qualquer barulho, como se tudo em volta fosse se despedaçar ao menor ruído, ao menor susurro
muito bom esse livro, recomendo
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