"Pedi tão pouco à vida e esse mesmo pouco a vida me negou. Uma réstia de parte do sol, um campo, um bocado de sossego com um bocado de pão, não me pesar muito o conhecer que existo, e não exigir nada dos outros e nem exigirem eles nada de mim. Isto mesmo me foi negado, como quem nega a esmola não por falta de boa alma, mas para não ter que desabotoar o casaco."
Fernando Pessoa - 'O Livro do Desassossego' - Texto VI.
Eu também sempre pouco quis, querido amigo. Creio por não querer de verdade, ou por querer o tudo que não se quer por sabê-lo longe ao roçar dos dedos.
Assim, compreendi com esses quereres de pouca valia que é melhor saciar-se com o mínimo, pois logo se torna rotina a seca de desejos, e desejar aniquila o espírito quando a causa é perdida.
Aos outros que estão sempre por perto, parece covardia tal inércia, mas os meus desejos são comuns como os seus e não preciso correr; eles me alcançam na simplicidade da vida querida.
Basta o pão, a água quente, o amor quase suficiente, o cobertor, o dia sem anseio do algo além de. Tal querer preguiçoso não causa feridas.
Porém a vida trapaceia e às vezes, lhe dá muito de algo quando se queria tão pouco de outro tanto.
Assim seja...
Tela de Ramon Aguilar Mora - Pintor Espanhol.
Terê Oliva
Um comentário:
Gostei mais do que você escreveu do que do trecho do livro.
E adorei a imagem!
Postar um comentário