Existem coisas irritantes nessa vida.
Pessoas, manias, barulhos, cheiros, bichos, densidades e proporções.
Pequenas e grandes iras das quais não se escapa por mais que delas fujamos. Estranhamos dentro de nós mesmos o ímpeto de assassinar a vizinha que coloca um rock metálico para tocar às 7 da manhã, e se crendo a personificação tropical da Madona, ainda esgarniça a voz ao cantá-lo com suas cordas granuladas.
Das pessoas que falam cuspindo é fácil se livrar, basta conservar segura distância, desde que a cuspideira não una à sua nuvem de saliva o jeito de falar pertinho, mais pertinho... Você se afastando, mais pertinho...
Tem gente que cutuca, que está sempre doendo, que conta mentiras deslavadas, que é megalomaníaca, que dá conselhos que você nunca pediu ou vai seguir, que fala alto ou baixo demais, que conversa com os olhos fechados, que come com a boca aberta, que conta segredos alheios, que fala da novela como se fosse notícia da primeira página de jornal, que revela o final do livro que você está lendo ou do filme que pretendia assistir no dia seguinte, que tem chulé, mau hálito e caspa, que fala mal de Deus e do mundo, que vive infeliz, que nunca ri da sua piada, que usa perfume da Avon. Tanto mais...
Porém nós, numa autoanálise nua e crua devemos confessar nossas mazelas, porque afinal ninguém nessa vida é perfeito, e com certeza incomodamos os outros na mesma proporção em que nos atazanam o juízo. Damos esse troco não por vingança, mas para que a convivência social seja harmoniosa e possível.
Sei que meu despertar cantante, e psicanaliticamente analisável pelo tamanho do bom-humor, agride àqueles que acordam sob o mesmo teto já atrasados e com a cabeça cheia de tarefas e preocupações.
Para quem não fuma, a fumaça dos meus cigarros deve ser um fator de irritação quase incontrolável, mas mantenho os cinzeiros limpos e as janelas abertas como a pedir desculpas.
Acredito que o pior e o mais enervante, até porque o é para mim mesma, seja a caça aos óculos. Só não pegunto à cachorra se não os viu por aí.
Já tentei de tudo para solucionar o problema, até numa ótica popular com preços inacreditavelmente baixos, creiam, comprei cinco iguais. Com minha metódica personalidade defini os cantos para cada um. Mas qual... Continuam desaparecendo como par de meia e brinco.
Alguém viu meu óculos? Alguém viu? Alguém viu?
Vi sim, estão na sua cabeça.
Tela de Paul Albert Guillaume - (1873/1942)
Pintor Francês.
Terê Oliva |
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